À noite as
fábricas são como catedrais iluminadas.
Estão ali,
diante de ti, imersas num silêncio que se pode tocar com a ponta dos dedos, e
segredam-te histórias de dias infinitos de suor, de corpos contorcidos com o
peso do medo, de corações apertados, de lágrimas contidas e com pressa em
correr mas só quando soa a sirene e se fecham os grandes portões de ferro elas
nascem do fundo dos olhos e inundam tudo. Como um rio, como um iceberg
derretendo ao ritmo abrasador de um sol a pique, como um mar rasgando a terra e
levando tudo no seu corpo, à sua passagem, como tudo aquilo que vem de repente,
quando já estava previsto há muito tempo.
Passamos ao
seu lado e sentimos que caminhamos em linha paralela rumo ao infinito.
Nós e elas.
Elas e nós.
E elas
sabem-no tão bem tal como nós o sabemos.
E
perguntamo-nos porque não entramos? Porque não abrimos os grandes portões e
percorremos os imensos corredores, as complexas linhas de montagem, os
escritórios adormecidos, as escadas em caracol (talvez chegássemos ao paraíso!),
os refeitórios assépticos, as casas-de-banho minúsculas.
Porque não
fazemos da sua presença a nossa presença?
Todo o seu
espaço podia ser o nosso. Todo o nosso espaço podia ser o delas.
Hesitamos.
Escolhemos
voltar para trás, retomar o caminho paralelo e desenhar no chão uma mensagem
onde todo o nosso mundo fique gravado como uma aliança celebrada no meio do
deserto. E elas perceberão quando, na próxima manhã, todos os homens ao abrir o
dia com os seus braços, sorrirem. E a luz da noite iluminará o dia inteiro
daqueles que aí vão morrer e nascer de novo.
As fábricas.
Aman
Aman
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